Empregados de cervejarias devem ter liberdade de escolha na hora de beber uma cerveja e não podem ser demitidos por esse motivo. Com esse entendimento, a Justiça do Trabalho decidiu que um promotor de vendas da Volpar Refrescos S.A., distribuidora das cervejas Kaiser e Sol, deve receber R$ 13 mil (17 vezes sua remuneração) de indenização por danos morais. Ele foi demitido após ser surpreendido por superiores bebendo cerveja Skol, marca considerada concorrente da Kaiser. A 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, ao não conhecer do Recurso de Revista empresarial, manteve decisões anteriores que consideram a dispensa ofensiva à liberdade de escolha.
O empregado contou que estava em um bar, à noite, com colegas de trabalho, fora do horário de expediente, ao lado da empresa, bebendo “umas cervejinhas” enquanto aguardava o ônibus que o levaria para uma convenção em Porto Alegre (RS). Quando acabaram as cervejas da marca Kaiser e Sol no bar, ele pediu uma Skol. Ele teve o cuidado de envolver a lata com um guardanapo, para não demonstrar publicamente que estava bebendo uma cerveja da concorrente.
Naquele momento, porém, uma supervisora da empresa passou no local e um colega, de brincadeira, tirou o guardanapo da lata, deixando aparecer a logomarca Skol. A supervisora, ao perceber que o promotor bebia cerveja da concorrente, o advertiu em público, diante dos colegas, gerando um princípio de discussão entre ambos. Poucos dias depois ele foi demitido, sem justa causa. Com base no artigo 5º da Constituição (princípio da liberdade), ele ajuizou reclamação trabalhista com pedido de indenização por danos morais no valor de R$ 70 mil.
A empresa, em contestação, negou que este tenha sido o motivo da demissão, bem como negou existir qualquer proibição de consumo de marcas concorrentes fora do horário de trabalho. Segundo a Volpar, o promotor foi demitido por ter se dirigido a seus superiores, após o incidente da cerveja, de forma agressiva e desrespeitosa. Alegou também que a empresa tem o direito de demitir empregados, sem justa causa, quando bem lhe convier.
O juiz da 1ª Vara do Trabalho de Florianópolis (SC) foi favorável ao pedido do empregado, após ouvir as testemunhas e concluir que ele não ofendeu seus superiores, como alegado pela empresa. “O empregado foi demitido em razão do livre exercício do direito de liberdade de escolha e opção, mais precisamente por ingerir cerveja da marca concorrente, procedimento que no mínimo desrespeitou as regras básicas implícitas ao contrato de trabalho, no sentido de que a relação entre as partes que o integram devem ser fundadas no respeito mútuo, atingindo, ainda, o direito à liberdade, previsto na Constituição Federal, artigo 5º, caput e inciso II”, assinalou a sentença. Ele fixou a indenização em R$ 13.262,55 (17 vezes a remuneração do empregado, utilizada para fins rescisórios, no valor de R$ 780,15).
As partes recorreram ao Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC). O empregado pediu o aumento do valor da condenação. A empresa reafirmou a tese inicial de que a rescisão do contrato não foi motivada pela ingestão de Skol. O colegiado não aceitou o pedido de nenhuma das partes. Manteve a sentença. “A empresa abusou de seu poder diretivo”, destacou o acórdão ao manter a condenação, assinalando também que o valor dado à condenação foi razoável.
A Volpar recorreu, então, ao TST. Argumentou que a mera dispensa sem justa causa do promotor de vendas não gera direito à percepção de indenização por danos morais, e que a CLT lhe garante o direito à liberdade de demitir injustificadamente seus empregados. O relator do acórdão, ministro Lelio Bentes Corrêa, ao analisar o recurso, observou que a discussão não trata da validade ou invalidade da dispensa imotivada, mas sim do direito à indenização por danos morais resultantes de ofensa praticada pelo empregador contra o empregado.
Segundo o ministro, o superior imediato do empregado confirmou em audiência que o promotor foi demitido em razão do episódio da lata de cerveja, tendo sido forjada uma demissão sem justa causa sob o fundamento de mau desempenho. O ministro consignou, ainda, que os julgados trazidos aos autos pela empresa para comprovar divergência de teses eram inespecíficos, pois não retratavam a mesma realidade ora discutida. O recurso não foi conhecido, por unanimidade. Assim, ficoumantido o valor fixado na sentença. Com informações da Assessoria de Imprensa do TST.
RR - 278000-91.2008.5.12.0001